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domingo, setembro 09, 2007

Antes de enlouquecer

Eu vivia no vento. Andava na névoa, mergulhava no ar, tudo era vento. Se comia, comia ar; beber, só bebia neblina. O meu próprio corpo era uma densificação de vapor, e mesmo o sexo era nada mais do que um vento gostoso que me soprava as entranhas - de vapor. Mundo também não era muito diferente, não tinha água ou terra, só céu. Com seus ventos. Das nuvens eu fugia, fortes demais - e elas mesmas se isolavam de nós, se ajuntavam e tomavam grandes porções do azul. Mas não tinha problema, o céu era de todo mundo. Mesmo que uns e outros se matassem por um pedacinho maior, não dava em nada. Uns matavam, mas ninguém morria. Como eu, eram também vento e - me atrevo a pensar - eram o mesmo, ou parte dele. Por todo o globo sopravam, seguiam sempre a mesma direção e o mesmo sentido. Não há nem como pensar que eram muitos os ventos que aqui viviam.

Nas minhas andanças pelo mundo-vento, um dia em que estava meio chateado, entediado mesmo, me aproximei de um sopro que não conhecia. Era um tanto quanto frio, mas o mais quente que eu havia experimentado. Sua própria voz me enevoava aos ouvidos e me tocava profundamente, e me deixava confuso, sem saber se eu mesmo era vapor ou, se agora, era névoa, neblina, ou mesmo um pedacico de ar. Fui me ajuntando, ainda sem saber o meu estado, e viramos nuvem. Daquelas que sempre me faziam fugir. E aí entendi o por quê de elas serem tão aglomeradas - na verdade, aquelas que ocupavam um espaço imenso e eu achava que eram um monte, eram só duas. Sempre só duas. E descobri que as grandes, apesar de causarem mais medo, eram mais fracas, mais distantes de si mesmas. Eu-nós agora era uma nuvem pequena, compacta, tão densa que fiz chuva.

Fiz tanta chuva que virei a própria chuva, virei água. E descobri que o mundo não era só vento, tinha água, só que era bem raro, difícil de ver. Mas agora eu era líquido, e corria, e tempestadeava, e molhava tudo quanto via. Subia aos céus, caía de novo, corria mais um pouco, sempre tocando algo que não conseguia atravessar, molhar ou me infiltrar. Por mais que tempestadeasse, que seguisse meu curso, sempre unido e compacto como nunca antes em estado de vento, havia aquilo ali que não me deixava correr tão livre, mesmo que não fosse uma barreira para nada. Porém, ainda era uma barreira - eu queria atravessar, molhar e me infiltrar. Nunca consegui. Me disseram outro dia que o nome disso, tão intransponível, é terra. Eu tocava a terra e não conseguia ser livre.

Mais ou menos por aí, depois de tanto tentar atravessar chão, piso, terra ou o que seja, me tornei salgado. Não pra ir pro mar, que não queria, mas porque me faltava essa infiltração. E sal é terra; se não posso tomar, pelo menos incorporo um pouco. Que erro! Logo me vi evaporando, perdendo o que tinha de água. Depois, em nuvem, comecei a me afastar, ventos sopravam de todos os lados e me arrancavam da minha tão segura densidade. Percorri céus, ainda em nuvem, sempre chuviscando o pouco de chuva que me restava. Em pouco tempo já não era mais nuvem, era vento de novo.

Agora, passou-se sei lá quanto, nem vejo mais água e, muito menos, terra. Minha vida, meu corpo, meu alimento, meu sexo, meu mundo agora é uma profusão de cores que eu nem consigo distinguir. Nem o vento eu tenho mais.

14 Comments:

Blogger Lucas Alan Pinto said...

Você tem o que quiser ter e o que se fizer ter. e ser.

9 de setembro de 2007 às 17:00  
Anonymous Anônimo said...

Para cada resposta, há uma correta pergunta.
Como seu amigo, digo que o que o protagonista fez ou deixou de fazer, não mudou significamente a terra nem o ar, nem os ventos nem as chuvas, e nem a Lei que rege a todos esses e outros.
Portanto, se alguém se salgou ou salgou outro alguém, ou se alguma aglomeração de ventanias ou de gases ou mares, ou seja o que for, recebeu fragmentos de sal ou vapores individualmente torpes,,,
isso nada importa ante a grandeza e invariabilidade e perfeição das Leis eternas.
Como disse certa vez um querido amigo já desencarnado, "seria como jogar uma mão de lama para o alto tentando manchar a face do Sol,,, pois obviamente que a lama retornaria seu percurso e simplesmente mancharia a face do jogante"

Bom, eu não gosto de entrar em assuntos dos outros, tentando corrigí-los, mudá-los, acusá-los, porque isso pode tirar a paciência das pessoas (já fiz isso,não é bom). Tenho que preocupar antes com minhas inúmeras imperfeições.
Porém, simplesmente por meu afeto à pessoa referida (exista ela, ou não), e a outras que porventura leiam isso, deixo sempre meus humildes conselhos e considerações, e ponho-me à disposição para conversas amigas..
Basta-nos sermos mais diretos nas versações e nas inquirições, e mantermos a sinceridade.

E o meu conselho aqui, é o perdão, que sempre tenho que citar, ensinado pelo Vento-Mor, o Cristo, que guia a todos os outros ventos desencaminhados e necessitados do que for. O perdão está dentro das Leis, e nos leva ao reconciliar. Reconciliar sempre,
com os pais, nossos e os dos outros, filhos, irmãos, amigos, etc.. e perdoar a pior das ofensas.. e pedir perdão por elas.
Amor... tão difícil de praticar..
(mesmo mentalmente,,, não necessitando de exageradas ações físicas ou o que for)(tudo começa na mente)




Um grande abraço. e manda um pra Barbieri, que não vejo há muito tempo.



(Laryssa Mariano;)

9 de setembro de 2007 às 17:48  
Blogger Lucas Alan Pinto said...

tipo:
"pedi e obtereis"
?né?

é..

9 de setembro de 2007 às 17:49  
Anonymous Anônimo said...

Não sou a mesma laryssa do comentário do texto anterior,,
tipo, não sou aquela sua amiga...

estudo na puc-coeu.
nem acreditei quando vi que existia outra pessoa com o mesmo nome meu...

9 de setembro de 2007 às 18:15  
Blogger Lucas Alan Pinto said...

Este comentário foi removido pelo autor.

9 de setembro de 2007 às 18:18  
Anonymous Anônimo said...

na realidade, o meu larissa escreve-se assim: larissa. e meu sobrenome é mariana, com "a"...
só que como eu li o texto anterior e vi que você se referia a mim e à bebiori(vc também escreveu errado o nome dela, ou diferente), e a belona, escrevi meu nome como no texto.

tá laryssa moça, não tô te copiando! desculpa.
bjos!*




(pra dizer a verdade, ainda não sei se você falava da gente ou não... mas deixa;)

9 de setembro de 2007 às 18:29  
Blogger Lucas Alan Pinto said...

essa larissa pode parecer louca de princípio, e até de final também, haha

brincadeira..
mas parece saber o que diz. pelomenos deixa espaço pra gente..
você(ela) deve estar tendo informações privilegiadas sobre os textos. não?
me explica também Bueno,, ora.

9 de setembro de 2007 às 18:51  
Anonymous Anônimo said...

pra mim, que não estou no bololô da confusão das larissas, o texto ficou bem legal... o final permite várias interpretações diferentes... uma pra cada estado de espírito... (pelo menos aconteceu comigo) mas whatever, méritos pessoais são pessoais...

agora, o curioso é que o texto poderia ser uma rapsódia sobre o nascimento do arco-íris, sem problema algum!

10 de setembro de 2007 às 13:25  
Anonymous Anônimo said...

Eu hein?

Se seu nome é Larissa Mariana, pra quê vc assinou Laryssa Mariano?

E o outro texto é dedicado a mim mesmo, não à vc.

Vou reler o texto e depois comento mais.

10 de setembro de 2007 às 16:11  
Anonymous Anônimo said...

então desculpa

10 de setembro de 2007 às 16:17  
Anonymous Anônimo said...

Ficou parecendo que eu tava com raiva mas num tô não!

=)

10 de setembro de 2007 às 16:18  
Blogger Unknown said...

Ai, que vontade de escrever alguma coisa e assinar como Larissa.. ou Laryssa. Só pra botar lenha na fogueira! Muahahaha!

No mais.. ótimo texto, Andrelino!
Tinha um tempinho já que não passava aqui. Mas já coloquei as leituras em dia ;)

Bjim

11 de setembro de 2007 às 15:03  
Blogger Mandix said...

Que doooooido!
Essa foi a melhor coisa sua que eu já li. Gostei pra valer. Sem falar que o texto é pedagógico, XD
Se eu fosse uma profa primária, ia uerer usar seu texto pra explicar o ciclo da chuva. Uma versão simplificada, claro, porque eu não ia querer um suicídio em massa de aluninhos... Ou i? Eu e o meu "amor" por pirralhos talvez falásemos mais alto que a noção...

Whatever. Do caralho. ^^

13 de setembro de 2007 às 17:09  
Anonymous Anônimo said...

Cara, devo confessar que, apesar do que o texto em si é legal, tenho praticamente certeza que não capitei tudo do conteúdo, ou pelo menos fiquei com impressão que parte das coisas do texto falam de coisas pessoais suas que não se adivinham só por ele... bom, avante adiante.

21 de setembro de 2007 às 17:17  

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