sem título (texto#12 c.08)*
Sua morte foi única. É chorada por todos, lembrada por ninguém. Eis o registro. Seu fogo se apagou mesmo quando perdeu seus amores e suas dores. Os nomes são muitos, nem mesmo ela se recordava. Teve Romeu, Don Juan e mesmo o nosso Bentinho. Amor era imortal, e ela se trajava de Liberdade. Vivia cem faces e era pouco - desaparecia com a brisa, os rios ou uma nota musical.
Apaixonar-se era nunca, quase um crime: impedia o soprar do vento sobre seus cabelos, a leveza das folhas outonais - muitas que nunca tocam o chão; vão aos céus, aos seus, a mundos e mundos. E a folha sumia, nem ao pó voltava.
Por vezes tinha vontade de ser seixo, seguia todas as águas, imperceptível, assumia as formas mais belas já lapidadas pela natureza... tonava-se ninfa, sereia e ensinava o mundo aos homens.
Tocou a terra e floresceu, alastrou-se sobre campos e campinas, virou flor, virou fada - tão leve, tão livre! Tinha o néctar mais puro em seus lábios, mel em seus seios. Era olmo, era freixo!
Nunca anoitecia: enluarava. Estrelas surgiam e sumiam, maravilhadas por seus cabelos, lhe deixavam versos e cantigas de presente. Mas foi traída. O vento jogou-a ao chão, a água afogou-a, a terra pisou-a. Descobriu que paixão não a prendia, ao contrário, estava no cerne de seu ser. Desencantou-se, chorou e caiu.
O motivo da descoberta não é mencionado. É de tristeza que faz definhar o mais feliz e sereno dos homens. Não admira, pois fez definhar a fada, sereia e rainha do vento. Deitada em seu leito de flores, nem mais um suspiro. As pétalas abandonam suas rosas.