A toca do Buenossauro

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Local: Belo Horizonte, MG, Brazil

domingo, agosto 19, 2007

sem título (texto#12 c.08)*

Vê essa mulher? Ainda viva, bela... morreu com sua rosa. Descorou, enegreceu, apodreceu. Morreu abatida pela truculência de todos os mares, o sarcasmo de todos os ventos e a indiferença de todas as terras.

Sua morte foi única. É chorada por todos, lembrada por ninguém. Eis o registro. Seu fogo se apagou mesmo quando perdeu seus amores e suas dores. Os nomes são muitos, nem mesmo ela se recordava. Teve Romeu, Don Juan e mesmo o nosso Bentinho. Amor era imortal, e ela se trajava de Liberdade. Vivia cem faces e era pouco - desaparecia com a brisa, os rios ou uma nota musical.

Apaixonar-se era nunca, quase um crime: impedia o soprar do vento sobre seus cabelos, a leveza das folhas outonais - muitas que nunca tocam o chão; vão aos céus, aos seus, a mundos e mundos. E a folha sumia, nem ao pó voltava.

Por vezes tinha vontade de ser seixo, seguia todas as águas, imperceptível, assumia as formas mais belas já lapidadas pela natureza... tonava-se ninfa, sereia e ensinava o mundo aos homens.

Tocou a terra e floresceu, alastrou-se sobre campos e campinas, virou flor, virou fada - tão leve, tão livre! Tinha o néctar mais puro em seus lábios, mel em seus seios. Era olmo, era freixo!

Nunca anoitecia: enluarava. Estrelas surgiam e sumiam, maravilhadas por seus cabelos, lhe deixavam versos e cantigas de presente. Mas foi traída. O vento jogou-a ao chão, a água afogou-a, a terra pisou-a. Descobriu que paixão não a prendia, ao contrário, estava no cerne de seu ser. Desencantou-se, chorou e caiu.

O motivo da descoberta não é mencionado. É de tristeza que faz definhar o mais feliz e sereno dos homens. Não admira, pois fez definhar a fada, sereia e rainha do vento. Deitada em seu leito de flores, nem mais um suspiro. As pétalas abandonam suas rosas.

-AB03//21/10/06
*nota: todo sistemático que sou com o que escrevo, numero os meus cadernos e, dentro deles, tenho numerações separadas para prosas, poemas, microcontos etc. Funciona bem pra organizar e, quando esqueço de colocar a data, fazer uma estimativa de quando é que foi escrito. Então esse aí é o décimo segundo texto do meu oitavo caderno.
Como podem ver, escrevi no fim de outubro do ano passado. Não foi dedicado a ninguém em especial, posto que estava completamente solteiro; mas foi muito importante pra mim, na época, porque ilustrou bem muitas impressões, idéias e sentimentos que eu estava derrubando.
Ah, já ia me esquecendo - "essa mulher" está desenhada no verso da folha do original, um rabisco a caneta mesmo.

sábado, agosto 18, 2007

Holy Smoke



Believe in me - send no money
Died on the cross and that ain't funny
But my so called friends are making me a joke
They missed out what I said like I never spoke
They choose what they wanna hear - they don't tell a lie
They just leave out the truth as they're watching you die
Saving your souls by taking your money
Flies round shit, bees around honey.

Holy Smoke, Holy Smoke, plenty bad preachers for
The Devil to stoke
Feed 'em in feet first this is no joke
This is thirsty work making Holy Smoke

Jimmy Reptile and all his friends
Say they gonna be with you at the end
Burning record burning books
Holy soldiers Nazi looks
Crocodile smiles just wait a while
Till the TV Queen gets her make up clean
I've lived in filth I've lived in sin
And I still smell cleaner than the shit you're in

Holy Smoke, Holy Smoke, plenty bad preachers for
The Devil to stoke
Feed 'em in feet first this is no joke
This is thirsty work making Holy Smoke

They ain't religious but they ain't no fools
When Noah built his Cadillac it was cool
Two by two they're still going down
And the satellite circus just left town
I think they're strange and when they're dead
They can have a Lincoln for their bed
Friend of the President - trick of the tail
Now they ain't got a prayer - 100 years in jail

Holy Smoke, Holy Smoke, plenty bad preachers for
The Devil to stoke
Feed 'em in feet first this is no joke
This is thirsty work making Holy Smoke

-Iron Maiden, do álbum "No Prayer for the Dying"

p.s.: na verdade esse post não tem muito sentido, só achei que a música combinava com a foto - pra quem não reconheceu, a igrejinha que tem ali na Olegário Maciel com Timbiras. Achei umas ainda maiores no Google, mas essa aí já é mais conhecida da galera de cá.

quinta-feira, agosto 09, 2007

The 'bus girl'

Pele muito clara, cabelo curto e escuro como os olhos. No corpo e no rosto, traços europeus que, por não serem escandinavos, até traziam um quê de exótico à sua aparência. Estava sentada mais ou menos no meio do ônibus e, logo que entrei, percebi seus olhos em mim. De que jeito me olhava? Com insistência, sei disso. Sentei no banco logo à frente do dela (e logo me arrependi, já que teria de me virar para mirá-la, o que daria muita bandeira). Foi uma força desumana que tive que fazer para olhar para trás só uma ou duas vezes até descer do ônibus. Aí, descaradamente, me virei para o ônibus e fiquei uns segundos ali, até que ela saísse de vista. Dessa forma eu descobri - não sei se pra minha felicidade ou vergonha - que a menina era tão ou mais descarada que eu e fixou os olhos nos meus; mas nenhum de nós abriu o mínimo sorriso, ao contrário do que costuma acontecer nos filmes americanos. Mas aí tudo bem, eu não sou jogador de futebol americano e ela (acho) não é líder de torcida.

No dia seguinte fiz questão de pegar o mesmo ônibus no mesmo horário, e lá estava ela. Dessa vez peguei um lugar um pouco mais pra trás e do outro lado do ônibus, pra ficar meio que na diagonal dela. Além de não se segurar, como eu fiz no dia anterior, e se virar várias vezes -mesmo que de forma tímida e até recatada, ela manteve o olhar (pude percerber porque a via de perfil) no canto dos olhos, de maneira que, mesmo que não me visse diretamente, me mantinha no seu campo de visão. A trilha dessa viagem, pelo que me lembro, era Black Sabbath e, em dado momento, o trecho inicial de Lord of this World me chamou a atenção: "You've searching for your mind don't know where to start/ Can't find the key to fit the lock on your heart(...)"

Em uma semana a encontrei mais umas quatro vezes no ônibus, e os olhares, de ambas as partes, se repetiram. Fui logo contar à Lena, que se interessou bastante pelo caso. Mais uns dois ou três encontros - sendo que num deles eu inclusive estava com essa minha amiga no ônibus, a menina se tornou um assunto tão comum, mesmo com outros colegas, que tivemos de encontrar um nome pra ela. Aqueles que ainda usavam o inglês para falar comigo batizaram-na "The Bus Girl"; os outros, que não viam problema em compartilhar a língua deles comigo, chamaram-na de "Buss Jenta". Até hoje não encontrei um nome em português. E começava assim também uma campanha pra descobrir se a menina tinha nome de gente, em que ano estudava (isso diria sua idade), onde estudava, etc.. Procurei por diversos anuários escolares para ver se a reconhecia em foto qualquer, perguntei pra diversas pessoas por alguém com aquele perfil; nada. Ao mesmo tempo não me atrevia a falar com ela, dado o estado da minha auto-estima e, de modo geral, minha timidez.

Até o dia em que ela não apareceu. Nem no dia seguinte, ou no seguinte ao seguinte, nem em uma semana, duas. Nunca mais a vi; penso, muitas vezes, que o que via era um espírito bondoso que me ajudava a atravessar aquele inverno cuja escuridão quase me matou. Espírito ou não, é verdade que ela se tornou uma dessas pessoas que vive, para toda a eternidade, em mim.