A toca do Buenossauro

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quinta-feira, junho 28, 2007

Deltaker*

Imagine você, que ainda hoje me perguntou, menti: sim, me ative ao raso, uma piada aqui, desconversa. Loucura inevitável, venho imaginando agora não ter mais saída. E não é que (ainda há pouco descobri) têm asas os pesadelos, que vivem por si próprios, mas só te encontram porque você os procura (injustiça dizer pesadelo: são sonhos rotos, mortos, que fogem ao seu controle e você descobre terem vida própria)?

Encontraram-se tão por acaso, como naqueles episódios de colisão e queda de livros. Quem sorriu primeiro? Ambos. Logo imaginaram ver todos os sinais de uma eternidade. E sem dúvida viveram tal eternidade! Mas será que tempo tão eterno deve ser vivido? Pois foi vida o que se colocou diante do tempo, que soprou-lhes nas velas o vento para o além. Acidente de carro, envenenamento, facada nas costas? Não foi morte, o que tiveram, foi pior. Tentaram viver uma eternidade daquelas que é pra ser morrida. Vivem mortos agora, apodrecendo com o pensamento do que não foi. Soltos, por aí, a imaginar o que não é, tão loucos por poder só especular - não mais possuem um a carne do outro, o outro a alma do um. Ou nada. Agora um deles depara-se com um rosto - isolado, frio, mas sorrindo. E descobre que o castigo continua.

Livro-me, inábil, versando imagens ainda tão frescas, da minha grande omissão e minha grande mentira. Imagine que menti! Meu reino pela falsidade pura! Eu, no entanto, digo que a Dinamarca fede mais do que parece.

*deltaker: palavra do norueguês, quer dizer (meio que forçando a barra) interlocutor. Escolhi logo o norueguês pra ter uma maior neutralidade quanto ao gênero da palavra.

segunda-feira, junho 25, 2007

Outro reencontro

Reencontro
O tempo passou pra ela,
o tempo não passou pra mim.
Não é que fiquei parado,
é só que não corri.

- 23/03/06


Entrei naquele prédio com a sensação de ter pisado ali já há muito, o que até não estranhei, sempre vivi na região. Tinha um playground grande, do qual com certeza eu me lembraria se já tivesse passado por lá. Então não era. Ia a uma festa, e não esperava ninguém realmente conhecido, estava quase de penetra. Para minha surpresa, um rosto bem familiar, e outro, e mais um; mas só, e ficou por isso mesmo.

Passei um tempo conversando com os amigos que acompanhava, cheguei inclusive a comentar uma história que escrevia há tempos, meio autobiográfica e meio moralista - o que não dá muito certo, porque uma autobiografia minha pode ser tudo, menos moralista. Uma história gostosa de escrever, ainda assim. Pegar casos e causos, aumentá-los, colocar um quê de fictício nas personagens que sim, quase todas, também têm seu quê de real. E tem essa personagem, a Laura. Uma mistura de outras duas personagens reais, nasceu de uma experiência bem inusitada que tive; bem completa, também, envolveu poesia e mistério, só faltou ação.

Aí que parei, olhei, me aproximei. Era uma menina que estava a um canto, na qual nem tinha reparado, mas que logo eu tive a impressão de tê-la conhecido há alguns anos.

- Oi, você estudou na...?
- Nossa! Você é o ...!

Essa facilidade com a qual ela se lembrou de mim me assustou, a princípio. Achei que eu fosse o louco ali, daqueles que sempre se lembra de nomes e rostos com facilidade incrível. Só depois atinei que as brigas e eventuais suspensões, além de muitos amigos, não sejamos injustos, me deram uma posição quase que de patrimônio, ou mesmo lenda da Escola. A menina se lembrava de mim, mesmo nunca tendo conversado comigo enquanto éramos colegas. Sexta série? Talvez.

Ainda tinha tudo da Laura que desenhei na minha história, menos o nome, claro, e as características da outra pessoa na qual a personagem também foi baseada. Fiz uma pergunta:

- Você chegou a descobrir... ?
- Então foi você?

Pronto! Me tirou o mundo das costas! Uns anos de trauma, vi que não era bem assim. Aqueles poemas, ou poemetos, anônimos, que não cheguei a entregá-los todos: logo no segundo ou terceiro (eram dez, ou mais) pensei que ela já tivesse descoberto minha identidade ultra secreta. Abandonei o plano, fiquei com vergonha, não olhei mais na cara dela, sumi. Se me sinto arrependido por não ter continuado com a idéia, já que, no fim das contas, ela não sabia de nada? Não, valeu o susto.

O que me deixa encucado mesmo é o tanto mudado nela. Fisicamente ainda é a ... que conheci, que se tornou Laura; mas, por dentro, dá pra ver que mudou muito. Pelo modo de sorrir, mesmo. Faz um curso interessante em uma faculdade respeitada, ganhou a vida e o mundo nessa conversa que tivemos. Agora ela existe, não é mais só uma imagem fosca da minha puberdade. Tem sua autonomia de pessoa viva, por mais que eu, se nos encontrarmos novamente, vá olhar pra ela quase que como a uma filha. Afinal, não deixou de ser, ou de ter, a personagem que criei.

Perdido assim, pasmo e indefeso frente à descoberta repentina de alg(uém)o completamente novo (por não ter podido acompanhar enquanto também crescia, o que me dá a terrível sensação de atraso, de ter ficado pra trás), retomo os versos que escrevi pra outra, nem de longe tão importante mas que também me despertou essa mesma sensação: "Não é que fiquei parado,/ é só que não corri."

terça-feira, junho 19, 2007

Como Lemmy Kilmister já dizia...


"REAÇÕES ADVERSAS/COLATERAIS
A maioria dos efeitos da isotretinoína está relacionada à dose. Com a dose recomendada, a relação risco-benefício é geralmente aceitável, considerando a gravidade da doença.

Sintomas relacionados com hipervitaminose A:
os seguintes sintomas são os efeitos indesejáveis mais relatados do isotretinoína - secura de pele e mucosas, isto é, de lábios, mucosa nasal (epistaxe), faringe (rouquidão) e olhos (conjuntivite, opacidade da córnea, e intolerância a lentes de contato).
Pele e anexos: exantema, prurido, dermatite facial, sudorese, granuloma piogênico, paroníquia, distrofia ungueal, aumento na formação de tecidos de granulação, queda persistente de cabelos, alopécia reversível, acne fulminante, hirsutismo, hiperpigmentação, fotossensibilidade, reações alérgicas, fragilidade cutânea. Piora da acne ocorre no início e persiste durante várias semanas.
Desordens do sistema nervoso central e musculo-esquelético: mialgia (dores musculares) com ou sem aumento da CPK (vide "Precauções e advertências"), dores articulares, hiperostose e outras alterações ósseas, tendinite.
Desordens do sistema nervoso central e psiquiátricas: alterações comportamentais, depressão, cefaléia, aumento da pressão intracraniana (pseudotumor cerebral), convulsões.
Desordens sensoriais: casos isolados de distúrbios visuais, redução da audição em algumas freqüências, fotofobia, distúrbios da adaptação ao escuro (visão noturna diminuída), raros distúrbios visuais de cor (reversível com a descontinuação), catarata lenticular, ceratite.
Desordens do sistema gastrintestinal: náusea, doença inflamatória intestinal como colite, ileíte e hemorragia têm sido relatadas. Paciente tratados com isotretinoína especialmente aqueles com altos níveis de triglicérides apresentam risco de desenvolverem pancreatite. Pancreatite fatal tem sido raramente relatada (vide "Recomendações").
Desordens hepáticas e biliares: elevações transitórias e reversíveis de transaminases, alguns casos de hepatite. Em muitos desses casos, as alterações estiveram dentro da variação normal e os valores retornaram aos níveis basais durante o tratamento. Em outros casos, entretanto, foi necessário reduzir a dosagem ou descontinuar o tratamento com isotretinoína.
Desordens do sistema respiratório: broncoespasmo tem sido raramente relatado; agumas vezes em pacientes com uma história prévia de asma.
Desordens sangüíneas: diminuição da contagem de células brancas, alteração de células vermelhas, aumento ou diminuição da contagem plaquetária, elevação da taxa de sedimentação.
Desordens do mecanismo de resistência: infecções locais ou sistêmicas por microorganismos gram-positivos (Staphylococcus aureus).
Outras reações: linfadenopatia, hematúria, proteinúria, pancreatite (especialmente pacientes com níveis séricos de triglicérides altos [>800mg] tratados com isotretinoína apresentam risco de desenvolver pancreatite), vasculite (por exemplo, granulomatose de Wegener), vasculite alérgica, reações alérgicas, hipersensibilidade sistêmica, glomerulonefrite.
ALTERAÇÕES DE EXAMES LABORATORIAIS: aumento de triglicerídeos e colesterol séricos, diminuição de HDL hiperucemia. Raros casos de diabetes têm sido diagnosticados (vide "Precauções e advertências")."


E como Lemmy Kilmister já dizia,
"But it don't make no difference
'cos I ain't gonna be, easy, easy
the only time I'm easy's when I'm
Killed by death
Killed by death
Killed by death
Killed by death"

(Motörhead, Killed by death, do álbum "No Remorse")



(...)

sábado, junho 16, 2007

Três

Lá chegávamos, as caras de espanto, de novidade, de sem saber. Incômodo nenhum, enquanto não fazíamos nem idéia do que era. Vi, de relance, a menina sobre uma mesa, e falava coisas pausadas. Ininteligíveis, pra mim ou pra qualquer dos presentes. Ainda me lembro do sorriso fraco que tentava. Foi tudo uma brincadeira que durou poucos minutos em algumas horas, agora que olhamos pra trás; nos ficam, no entanto, as palavras soltas por uns e as risadas praticamente imploradas por outros. Um céu que era azul e escureceu, para amanhecer de novo; é assim que me sinto tantas vezes. Fechada, quando me dá uma palavra tenho um raio de sol, daqueles que cega. Com três delas, uma vez, em uma pergunta bem colocada, me fez sorrir a perda daquelas outras de antes. Estou ainda intimidado com uma simples complexidade tão inalcançável que se põe diante dos meus olhos - todos os limites entre o falar e o calar, sempre à prova para alguém que quer cativar um amigo, mas ainda tem medo de mundo.

Cedo, aí, uns minutos ao espelho. Leio nos meus próprios olhos, em outro, tudo aquilo o que fui, o que sou e o que deixei de ser. É bem original seu modo de me dirigir as considerações mais puras e também as vis, com uma sinceridade ímpar e quase etérea. Busco nesses gestos e palavras as outras chances de movimento que eu teria, as respostas de mim para mim, uma lógica para meu próprio ser. Entendo, nele, também não um ser que se torna único ou imutável: muitas vezes é ele a própria síntese das (des)mudanças no meu caráter. Recebo as notícias do dia, da noite, da semana - um comentário ou outro, silêncio. Um muro alto que não quebrei ainda dentro de mim mesmo, uma carruagem sem cavalos. Apesar de acuado e indeciso, tomo dos meus sentidos, apuro-os e... jogo fora. Assim me diz um espelho que nada tem de mim.

Perco-me em mim mesmo, no meu espelho, no meu silêncio. Encontro somente mais um tão diferente, tão igual e gentil. Daqueles bem tímidos como luto para derrubar, não ele, que timidez lhe cai bem, mas o meu modo sofrido que escondia atrás dos olhos. Recordo que um jeito vago delineia algo que eu tenho de meu, de secreto e verdadeiro. O que é ainda não sei; se nobre ou pobre, a diferença é meramente consonantal. Sei desses três caráteres fundidos em um só, aqui, em mim, que representam momentos, umas e outras palavras e também sorrisos. Mundos que descubro por tropeços e coincidências, mas nos quais ainda não consigui entrar, dos quais talvez nunca faça parte. Mas já são mundos que fazem parte de mim - mesmo que (e agora me preocupo com o limiar do falar) por poucos momentos nos quais percebo alguma poesia.

domingo, junho 10, 2007

Timidez

Chama-me poeta
que te logo erro:
abandono meus versos
a morrer por não-mãos.



nota: esse é pra Mahatma, que faz mais falta do que pensa que faz.

terça-feira, junho 05, 2007

Canto

Descanso cuidadosamente o último resto do cigarro sobre o cinzeiro de vidro. Me estico na poltrona, engasgo com a fumaça, meus olhos lacrimejam. De embaçados que ficam, o quadro pendurado na minha parede muda de cor e toma uma face, mas rápido enxugo os olhos e tudo desaparece. O quatro está ali, pois sim; me traz todas as impressões de sofrimento de mundo. Um grito, uma deformidade, um tom forte.

Fujo do quadro. A xícara de café está quase vazia, e nela vejo meu reflexo. Outro grito, deformidade, tom forte. E vejo também uma injustiça... já que me veio à cabeça, corrijo-a: o absurdo machista que permeia as cantigas populares e atribui, a nós homens, uma fria superioridade. Seguindo meu próprio exemplo, ali, no meu canto, troco uma única palavra.

"O Cravo brigou com a Rosa
debaixo de uma sacada
o Cravo saiu morrido
e a Rosa despedaçada."